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02/02/2016

Ação do MPF/AM faz Justiça proibir empresa de extrair piaçava em Barcelos

Foto: Reprodução / Internet

Liminar proíbe empresa e proprietário de dar adiantamento a trabalhadores ou cobrar dívidas existentes

A empresa L. C. Morais Rocha Comercial e o proprietário dela, o empresário Luiz Cláudio Morais Rocha, conhecido como 'Carioca', estão proibidos de promover a exploração do trabalho e a comercialização de piaçava baseados no regime de aviamento. A determinação foi da Justiça Federal, em decisão liminar concedida após pedido do Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) em ação civil pública ajuizada no ano passado. Da decisão, cabe recurso.

 

Na ação civil pública, o MPF busca a reparação pelos danos causados pela empresa e 'Carioca' a comunidades indígenas e ribeirinhas do município de Barcelos (a 399 quilômetros de Manaus), por meio da contratação irregular e exploração de trabalho em condições semelhantes às de escravidão na extração da fibra da piaçava.

 

Investigações realizadas pelo MPF e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) que culminaram em operação de resgate de 13 trabalhadores, entre abril e maio de 2014, reuniram depoimentos e constataram in loco o funcionamento de uma cadeia de exploração de trabalho escravo comandada pelo empresário e sua empresa, por meio de aviamento. O processo demonstra que os empregados eram mantidos em condições extremamente precárias de trabalho, submetidos a uma relação de servidão por dívida, sem qualquer vínculo formal e garantias de direitos trabalhistas.

 

A partir da decisão liminar, a empresa e seu proprietário não podem promover qualquer tipo de adiantamento ou relação não regularizada com os trabalhadores, nem cobrança de supostas dívidas pretéritas baseadas naquela relação.

 

Na decisão, a Justiça Federal reconhece que “as práticas apontadas pelo MPF demonstram que a violação aos direitos do trabalho seria intensa e persistente, submetendo indígenas e ribeirinhos a trabalhos forçados, jornadas exaustivas e condições degradantes de trabalho, sem as condições mínimas de higiene e sem os eventuais equipamentos de proteção necessários ao exercício da atividade, conforme se observa nas fotos e nas descrições constantes nos relatórios do Ministério do Trabalho e Emprego juntados aos autos”.

 

A ação civil pública segue tramitando na 3ª Vara Federal, sob o nº 0014847-20.2015.4.01.3200.

 

Bens bloqueados da empresa e empresário

 

Em outubro do ano passado, a Justiça Federal determinou, em caráter liminar, o bloqueio de bens e valores da empresa e do empresário no total de R$ 500 mil. Eles recorreram pedindo o desbloqueio dos valores depositados em contas bancárias, argumentando que os bens imóveis seriam suficientes para garantir o valor determinado. A Justiça afirma, na decisão liminar proferida esta semana, que não há prova de tais imóveis no processo e, por isso, o bloqueio dos valores foi mantido.

 

Como pedidos finais da ação, que ainda deverão ser analisados e decididos por meio de sentença, o MPF/AM requer à Justiça que determine aos processados a formulação e ampla divulgação, durante três meses seguidos, de pedido de desculpas aos povos tradicionais da região pela situação degradante as quais seus integrantes foram submetidos.

 

Para evitar que outros empresários mantenham a mesma prática ilegal em seus negócios, a ação pede também que os responsáveis sejam obrigados a elaborar comunicado a todos aqueles com quem Luiz Cláudio e sua empresa mantém relações comerciais informando sobre a ação de resgate de trabalhadores e a existência de ações penais, trabalhistas e civis em andamento contra a prática de trabalho escravo na região e, ainda, que financiem publicação de material didático sobre os males do trabalho escravo contemporâneo a partir de conteúdo a ser elaborado pelas associações de indígenas da região, com apoio das universidades públicas do Amazonas e entidades não-governamentais.

 

Outros exploradores sujeitos à ação

 

Embora a decisão seja direcionada para 'Carioca' e sua empresa, ela aponta para a irregularidade da forma de exploração do trabalho escravo. Assim, outros patrões que também estejam explorando os indígenas e ribeirinhos estão sujeitos à punição, inclusive no âmbito criminal.

 

Apesar de haver termo de cooperação técnica firmado entre diversos órgãos estaduais e federais, assumindo o compromisso de combater a exploração ilegal e buscar a estruturação da cadeia produtiva da piaçava na região, não houve avanço na regularização da cadeia e o MPF estuda medidas de responsabilização dos órgãos.

 

Vítimas de exploração do trabalho escravo

 

Em 2013, uma investigação foi realizada pelo MPF e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), além do envolvimento do Ministério do Trabalho e Emprego, da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e do Exército Brasileiro, quando que foram constatadas irregularidades nas relações sociais relativas à atividade de extração da piaçava na região do Médio Rio Negro.

 

Os trabalhadores eram submetidos ao regime de aviamento, em que os patrões forneciam aos 'piaçabeiros' meios de trabalho, como barcos, combustível, ferramentas de trabalho, alimentos e outros itens por preços abusivos como 'adiantamento' para iniciar os trabalhos. Como o acesso a armazéns ou comércios da cidade era difícil, o trabalhador se via obrigado a adquirir tais mercadorias, vendidas a preços abusivos e que chegam a gerar 300% de lucro ao patrão. O pagamento da dívida consumia quase todo – ou até mais – o salário recebido.

 

O regime de servidão por dívida é proibido por nomas internacionais, como as Convenções nº 29 e 205 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), e pela legislação brasileira, em normas como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e o Código Penal.

 

Durante a investigação, foram resgatados 13 trabalhadores encontrados em situações análogas à de escravo. Tais trabalhadores não possuíam carteira de trabalho assinada, recebiam menos de um salário-mínimo mensal (nas vezes que recebiam), não recebiam 13º salário, não tinham férias e trabalhavam todos os dias da semana. Entre os trabalhadores identificados como vítimas de exploração estavam indígenas da etnia Yanomami. Também foi constatado que alguns dos trabalhadores viviam submetidos a condições semelhantes à de escravidão havia mais de dez anos.

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