20 de Abril de 2024 - Ano 10
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05/11/2017

Marieta abre sua casa e reflete sobre o 'baque' dos 70 anos.VEJA ENTREVISTA!

Foto: Nana Moraes / Styling / O Globo

Marieta Severo posa em sua casa, no Rio

Marieta Severo surge na sala de sua casa, na Gávea, de calça e blusa de malha, com cabelos longos e alourados. Sente-se inadequada com o visual (“Minhas netas acham que meu cabelo está parecido com o das filhas cafonas do Donald Trump”) e conta que estava tensa na noite anterior ao encontro com a equipe da Revista Ela.

 

— Ontem, eu pensei: “Meu Deus, estou tão quieta no meu canto.” Há um ano não dou entrevistas. Aí, vão ficar comentando nas redes sobre o que falei... — diz a atriz, que, diante do clima de Fla-Flu que vem marcando as posições políticas e da avalanche de fake news, achou melhor ficar muda.

 

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Ao menos na ficção, agora ela vai falar, e muito: está na próxima novela das 21h, “O outro lado do paraíso”, que estreia no dia 23, no papel da vilã Sophia, o motivo pelo qual anda por aí com a vasta cabeleira. Mas acha que está fora de forma para folhetins longos — o último foi “Laços de família”, no ano 2000.

 

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— Estou destreinada, mas fico treinada rapidinho — brinca.

 

Diante de tudo isso, pode-se concluir: Marieta, 70 anos de idade e 50 de carreira, uma das maiores atrizes do Brasil, é gente sem cerimônia ou estrelismos. Tem bad hair day, medo de ser mal interpretada e ansiedade com trabalho novo. Enche-se de coragem e topa fazer foto mesmo não curtindo os cabelos, recebe a reportagem na própria casa, bate papo por horas e encara a exaustiva rotina dos Estúdios Globo todo dia.

 

— Continuo sendo muito destemida. Sou muito prática. Talvez tenha ganhado elasticidade interna por causa de tantos personagens — reflete ela, que usou muito dessa maleabilidade para criar três filhas, um neto, que adora tocar piano nos almoços de domingo, e seis netas, todos frutos do casamento com Chico Buarque, que terminou em 1999.

 

Marieta se adapta muito bem — é assim que conseguiu lugar no olimpo da dramaturgia brasileira. O processo, no entanto, nunca foi e ainda não é simples. A vilã Sophia, por exemplo, a fez chorar diversas vezes, depois de agredir verbalmente a filha anã, Estela, interpretada pela atriz Juliana Caldas. É a primeira vez que o nanismo é abordado numa novela, e coube a Marieta dar voz ao preconceito e à desinformação que envolvem a questão.

 


Marieta Severo (Foto: Nana Moraes)


— Nos primeiros ensaios, estávamos tão concentradas olhando nos olhos uma da outra que comecei a me emocionar. Quando acabou, ela estava fora de cena chorando também. Veio me pedir desculpas por ter sido tão dura e me abraçou — conta a estreante Juliana, que define Marieta como uma dama. — E ela é muito engraçada também!

 

Foi tão difícil para a dama vociferar preconceitos contra Juliana/Estela, que, pasmem, ela até repensou o ofício.

 

— Quase larguei a profissão (depois de cenas de preparação). Fico me perguntando por que me emprestar para coisas tão cruéis — reflete Marieta. — Espero que as pessoas entendam nossa vontade de apontar essas relações ruins. Hoje, as coisas são levadas tão ao pé da letra, e a gente precisa explicar que estamos fazendo uma denúncia através de um personagem.

 

Para ela, uma das razões da falta de sensibilidade do público é a internet. Marieta não tem Facebook, Twitter ou Instagram, mas fica sabendo de todos os extremismos desses territórios livres. Acompanhou, mesmo off-line, em agosto, a polêmica envolvendo a primeira música de trabalho do álbum “Caravanas”, de Chico Buarque. Os versos “Quando teu coração suplicar/Ou quando teu capricho exigir/Largo mulher e filhos e de joelhos vou te seguir”, da música “Tua cantiga”, seriam uma ode ao machismo aos olhos de muita gente.

 

— Vivemos numa época em que a poesia e a ironia não são entendidas — diz a atriz. — Sou hiperfeminista desde a década de 60, mas a liberdade de criação tem que ser absoluta. Se for assim, do cancioneiro popular não vai sobrar quase nada. Essas coisas vão emburrecendo o ser humano.

 


Com a turma de críticos de “Tua cantiga”, ela não concorda; no entanto, aplaude de pé o movimento surgido com a hashtag #chegadeassedio.

 

— Lembro-me de quando perguntavam, há 15 anos, se eu era feminista. Aí vinha aquela papo de “você é contra os homens”. Essa retomada me enche de alegria. Tem que ter “chega de assédio”, chega disso, chega daquilo — diz, ressaltando que o movimento, para ela, ainda é incipiente. — Temos a tendência de esquecer que isso vem de uma pequena camada. Para extratos da população que não têm benefícios tão grandes, ainda há muita batalha.

 

Por este e outros discursos, Marieta diz que costuma ser chamada de “comunista caviar”, o que lhe arranca algumas risadas:

 

— Onde tem comunista? Não tem mais, só o louco da Coreia do Norte.

 

Entre piadas e papos sérios, ela vai tocando, diariamente, os teatros Poeira e Poeirinha, espaços de pesquisa, discussão e encenação, mantidos em sociedade com Andréa Beltrão, em Botafogo. Lá, as duas abrem portas para projetos experimentais de artistas que não contam com verba para pôr os espetáculos de pé. O patrocínio delas, por sua vez, vem em boa parte da Petrobras. Prato cheio para o virtual “comando de caça aos comunistas caviar”:

 

— As pessoas pensam que estou mamando nas tetas do governo. O teatro é deficitário. Todo mês, Andréa e eu botamos dinheiro lá com a maior alegria. Acho que falta às pessoas que têm condição financeira no Brasil um pouco de sentido público, de consciência da nossa cultura.

 

A veia empreendedora impressiona até mesmo quem se debruça sobre a carreira da carioca. Nicole Marengo, do Instituto Tom Jobim, está desde dezembro de 2016 imersa em todo o material iconográfico das mais de 22 produções para TV, 31 peças de teatro e cerca de 37 filmes, entre longas e curtas. A ideia é mostrar fotos, roteiros de peça, textos e reportagens no site portal.jobim.org, a partir de novembro.

 

—Marieta tem viés artístico aliado a raciocínio de produção. Não trabalhou apenas na zona de conforto. Arregaçou as mangas e, independentemente de apoios, construiu bases para o que realmente acredita — observa Nicole.

 

Organizar a história ao lado da equipe do instituto faz parte das providências que começou a tomar quando fez 70 anos, em novembro passado. Ela lançou mão do pragmatismo para revisitar tudo que lhe é importante e caro. Até as bonecas de barro que enfeitam a casa foram classificadas por ano de criação e autor, num inventário particular. Tudo parte da “reorganização etária”, como gosta de dizer.

 


Algumas das bonecas de barro de Marieta Severo (Foto: Nana Moraes)


— Vamos falar claro: os 70 anos são um baque. Você para e fala: “É comigo?” Não tive isso nos 60 anos, mas agora vejo que a fila está andando e estou ficando lá na frente — brinca ela, que ainda hoje se emociona ao falar de Leila Diniz, Nara Leão e Dina Sfat, que chegaram na frente da tal fila antes mesmo de fazer 50. — Quando preciso, minhas santas são minhas amigas que morreram. Na hora do aperto, eu peço: “Leila, me dá uma ajudinha aí?”

 

Marieta emana uma energia que muitas vezes falta a um monte de jovens atrizes por aí. Marco Nanini, amigo e parceiro em vários trabalhos (somente em “A Grande Família”, os dois conviveram quase diariamente de 2001 a 2014), brinca que se sente até humilhado com tanta disposição.

 

— A disponibilidade dela para coisas novas é da mesma proporção do talento. Está sempre documentando a cena teatral. É uma mulher inquieta. Quando vejo, já me canso — brinca ele, entregando que ela só parava, na época do seriado, para dar um cochilo de 20 minutos depois do almoço e para ler os jornais do dia, religiosamente.

 

A vivacidade, ela concorda, não foi impactada pelos anos. O corpo reclama, mas isso é um ônus muito suportável, se comparado aos prazeres da maturidade.

 

— O tempo te dá uma maneira de se relacionar com a vida que eu gostaria de ter tido sempre. Fui uma jovem bem agoniada, fiz muita psicanálise. Tinha essa coisa de entender tudo. Não entendi nada, mas tudo bem — diz Marieta, que hoje namora o diretor de teatro Aderbal Freire Filho, de 76.

 

A natureza pode ter lhe dado rugas, mas continua lhe tratando muito bem. Teria esse viço a ver com sexo? Ela dá risada, daquelas bem largas:

 

— É possível sexo aos 70, sim. A vida vai te tornando mais sábia até nisso. Você aprende, aprende e usufrui.

 

É dica de quem sabe das coisas.

 

O Globo / Ela 

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