Indicações a segurança interna e meio ambiente sinalizam rupturas políticas
Duas nomeações feitas pelo presidente eleito Donald Trump para o primeiro escalão do próximo governo dos Estados Unidos indicam sua intenção de levar adiante, após sua posse em 20 de janeiro, promessas de linha-dura que foram foco de grande controvérsia durante a campanha à Casa Branca.
Tanto na área ambiental como na de segurança interna, nas quais foram anunciados os dois nomes, o republicano mira no desmantelamento do legado do presidente Barack Obama em temas como imigração e contenção do aquecimento global. As reações não se fizeram esperar.
Trump tem recorrido a líderes militares para ocupar cargos de alto escalão em Defesa e segurança. Como revelou a imprensa americana, o presidente eleito selou a indicação de seu terceiro general no setor: John Kelly, de quatro estrelas, deve liderar o Departamento de Segurança Interna. Linha-dura nas atividades militares e nas declarações, ele terá entre suas atribuições ainda o controle migratório.
Mais longevo general do corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos, com uma carreira militar de 45 anos, Kelly foi promovido a general em março de 2003, quando combatia no Iraque, sendo o primeiro militar americano a conseguir uma promoção em plena operação desde 1951. No Comando do Sul, sua última posição de liderança, era responsável por atividades e relações militares com a América Latina e o Caribe. No campo de batalha, sofreu sua perda mais dura: seu filho mais jovem, o tenente Robert Kelly, morreu no Afeganistão, em 2010.
As posições de Kelly o levaram a criticar o presidente Barack Obama em diversas questões. Apesar de críticas de defensores de direitos humanos, o general defendeu a prisão na base naval de Guantánamo, e a prática de alimentar à força detentos que realizassem greves de fome.
General John Kelly: militar iria para a Segurança Interna (Foto: Reprodução)
Reservas até entre republicanos
A escolha foi recebida com reservas mesmo por congressistas republicanos:
— Espero que ele entenda as questões profundas com as quais essa agência lida — afirmou o congressista nova-iorquino John Katko. — Ele tem um problema gigantesco nas mãos. Terá que aprender rápido e agir. E espero que ele queira colaborar com a Câmara.
Trump integrou outros dois generais da reserva: James Mattis comandará a Defesa, e Michael Flynn será assessor de Segurança Nacional. Kelly e Mattis precisam ser confirmados pelo Senado.
Para o comando da Agência de Proteção Ambiental foi escolhido Scott Pruitt, procurador-geral de Oklahoma e um dos principais nomes na batalha contra as políticas ambientais de Obama.
A escolha reflete comentários feitos por Trump durante a campanha presidencial nos quais o magnata afirmou que a ideia de que o aquecimento global seria resultado de ações humanas era “uma farsa elaborada pela China para tornar os Estados Unidos menos competitivos”. Além disso, o republicano condenou os Acordos de Paris sobre mudanças climáticas, e classificou a política energética de Obama como uma guerra à indústria do carvão.
Em maio, Pruitt assinou um artigo no diário “Tulsa World”, no qual colocou em xeque a participação humana nas mudanças climáticas, a firmando que o debate sobre o tema está “longe de ser definido”.
“Cientistas continuam discordando sobre a escala do aquecimento global e suas possíveis conexões com as ações da Humanidade”, escreveu o procurador-geral.
Ao contrário da maioria dos procuradores-gerais que costumam levar empresas ao banco dos réus para fazer com que sigam as leis determinadas, Pruitt teve diversas companhias de petróleo e gás ao seu lado nos tribunais ao questionar os riscos econômicos das regulações ambientais. Os laços com a indústria trouxeram-lhe benefícios. Em 2013, Harold G. Hamm, chefe da petrolífera Continental Energy, da Dakota do Norte, foi copresidente de sua campanha de reeleição.
Donald Trump estampa a capa da revista Time (Foto: Reprodução)
Custos do Air Force One serão revistos
A escolha do procurador-geral de Oklahoma recebeu duras críticas de senadores ligados a questões ambientais. “O histórico de Pruitt não apenas é o de alguém que nega a existência das mudanças climáticas, mas também o de alguém que trabalhou ao lado da indústria energética para tornar este país cada vez mais dependente de combustíveis fósseis”, disparou, em comunicado, o senador Bernie Sanders. “O povo americano deve exigir líderes dispostos a transformar nossa matriz energética, afastando-a de combustíveis fósseis”.
Em outro episódio, após ser atacada por Trump, a Boeing se comprometeu a rever os custos de produção do futuro avião presidencial americano: segundo o magnata, o custo seria US$ 4 bilhões, já a empresa alega que o total estaria ao redor de US$ 1,6 bilhão.
“O presidente da Boeing, Dennis Muilenburg, conversou ontem (terça-feira) por telefone com o presidente eleito Trump. Muilenburg parabenizou Trump por sua vitória eleitoral e se comprometeu a trabalhar com o novo governo para controlar os custos com a finalidade de que o novo programa Air Force One se mantenha no melhor preço possível”, informou, em nota, um porta-voz do grupo.
O principal fabricante aeronáutico ucraniano, Antonov, se ofereceu para construir o novo Air Force One. A sugestão, feita em tom bem-humorado, foi publicada no Twitter do fabricante. “Quem sabe deveria considerar Antonov como o próximo Air Force One?” sugeriu o fabricante, construtor do maior avião de carga do mundo, o An-225 Mriya.
Prestes a assumir o cargo mais importante da política mundial, Trump foi eleito pela revista “Time” a personalidade do ano de 2016, seguindo a tradição da revista de conceder o prêmio aos presidentes americanos no ano de sua eleição. Em editorial no qual explica a escolha, a editora Nancy Gibbs destaca que sua vitória “trouxe ecos de populistas americanos do passado, derrotou as duas principais dinastias políticas do país e reflete a ascensão de nacionalistas em todo o mundo”.
Michelle e Barack Obama embarcavam no Air Force One em 2013,
na Tanzânia (Foto: Doug Mills / NYT)
O Globo