19 de Abril de 2024 - Ano 10
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24/05/2020

Apoio de Bolsonaro fortalece agenda econômica de Guedes, mas vídeo de reunião eleva incerteza, dizem analistas

Foto: Reprodução

Cenas da reunião ministerial de 22 de abril tranquilizaram equipe econômica na disputa com Rogério Marinho, mas instabilidade política joga contra o crescimento

Apesar de aumentar a instabilidade política no país, um dos principais fatores para decisões de investimentos, o vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril tem passagens que fortalecem a agenda do ministro da Economia, Paulo Guedes. A avaliação é de integrantes da equipe econômica e de analistas diante do apoio expresso por Jair Bolsonaro à condução da política econômica por Guedes.

 

Por outro lado, apontam que as impropriedades ditas na reunião aumentam as incertezas com o acirramento da crise política enquanto o coronavírus avança.

 

Na visão de duas fontes próximas a Guedes, a divergência entre o líder da equipe econômica e o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, sobre o uso de dinheiro público em projetos para ajudar na retomada do crescimento econômico após a pandemia foi superada na reunião.

 

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O vídeo divulgado pelo ministro do Supremo Celso de Mello no âmbito do inquérito que apura a tentativa de interferência do presidente na Polícia Federal tem várias cenas com Bolsonaro apoiando Guedes e o que chamou de "livre mercado".

 

Pelo menos, neste momento, qualquer que seja o plano a ser colocado na praça, este deve prever investimentos privados, dizem as fontes. Não terá participação direta do Estado, como ocorreu em governos anteriores e chegou a ser defendido por Marinho com apoio do ministro-chefe da Casa Civil, Walter Braga Netto.

 

Essa interpretação coincide com a de analistas econômicos, que esperam reação positiva dos agentes econômicos ao trecho do vídeo em que Guedes critica o plano esboçado por Marinho para recuperar a economia e é apoiado pelo presidente na defesa de crescimento movido por recursos privados.

 

Para André Perfeito, economista-chefe da Necton Corretora de Valores, além de Guedes, outros integrantes da ala econômica, como os presidentes do Banco Central, Roberto Campos Neto, e do BNDES, Gustavo Montezano, foram coerentes com que vêm defendendo nos últimos tempos:

 

— Bolsonaro se coloca como liberal. Houve um tensionamento entre Marinho e o Guedes, mas o presidente deu respaldo a Guedes. O vídeo tranquiliza em relação a isso. Quem ganhou a disputa foi o Paulo Guedes.

 

Risco elevado


Para a consultora econômica Zeina Latif, a falta de fatos novos sobre a acusação de interferência de Bolsonaro na PF também deve favorecer uma reação positiva do mercado, mas ela frisa que a desorganização do governo cria ainda mais incerteza. Ela achou inadequada a presença do presidente do Banco Central na reunião, mesmo que a autoridade monetária ainda não tenha autonomia no Brasil:

 

— O que me preocupou nesse vídeo foi a falta de profissionalismo, não digo generalizada, mas num contexto geral. Não foi um bom sinal do ponto de vista gerencial. Não que seja surpresa, não surpreende nada. Mas não passa a imagem de um governo que está aparelhado para reagir à altura da grave crise, isso de uma forma geral. Não enxerga estratégias. Confirma o sentimento ruim da incapacidade do governo em várias frentes — avalia a economista.

 

Ela continua:

 

— Ficou um gosto amargo, pela baixa qualidade da reunião, do ponto de vista administrativo. Isso não é neutro para a agenda do país.

 

Para Perfeito, o vídeo comprova sim a interferência de Bolsonaro na PF, o que pode provocar tensões no mercado se o processo contra o presidente for adiante.

 

Zeina espera que o apoio verbal dado por Bolsonaro a Guedes se traduza na prática e resista a em momentos críticos, como quando será preciso focalizar a distribuição de auxílio emergencial e até diminuir o valor. O ministro já chegou a propor baixar de R$ 600 para R$ 200.

 

Claudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios, diz que essa instabilidade já está embutindo prêmios de risco aos negócios. Ou seja, o retorno dos investimentos precisam ser ainda maiores pelo risco, o que na prática desestimula novos negócios:

 

— A previsibilidade, a estabilidade, a redução de incerteza, por motivos óbvios, são muito importantes para empresários e investidores. Quando tem percepção de confusão, de desorganização, o efeito é exatamente o oposto. Começa-se a embutir isso no prêmio de risco. O vídeo mostrou que houve um deslocamento, uma ampliação desse segmento mais ideológico, em detrimento do mais racional, pragmático. Esse espaço se reduziu objetivamente.

 

O economista José Júlio Senna, da Fundação Getulio Vargas (FGV), avalia que é importante o governo ter rumos traçados na saúde e na economia neste momento, o que não ficou evidente para quem vê o vídeo da reunião ministerial:

 

— No meio de uma crise, é importante para os agentes econômicos que haja sinais fortes, claros, bem identificados do rumo da economia e na saúde. Muita gente pode imaginar que as reuniões são sempre assim. É importante ter definições para frente.

 

A queda de braço na reunião


Na reunião, Guedes e Marinho demonstraram que não pensam da mesma forma quando o assunto é a recuperação da economia. De acordo com uma fonte, o respaldo de Bolsonaro aliviou a preocupação da equipe econômica com a insistência do ministro da Casa Civil, Braga Netto, em lançar um plano semelhante ao PAC sem envolvimento direto do titular da Economia. Bolsonaro indicou que qualquer estratégia para a economia tem que passar por Guedes.

 

Embora a divulgação do vídeo tenha sido motivada pela afirmação do ex-ministro da Justiça e da Segurança Pública Sergio Moro de que Bolsonaro tinha intenção de interferir na Polícia Federal, a reunião foi pedida por Braga Netto.

 

O ministro da Casa Civil queria apresentar as linhas gerais do programa Pró-Brasil, que chegou a comparar ao Plano Marshall, financiado pelos EUA para reconstruir os países aliados da Europa após a Segunda Guerra Mundial. Visivelmente desconfortável, Guedes rechaçou a comparação na reunião, dizendo que demonstraria “um despreparo enorme”.

 

Braga Netto atribuiu a ideia do programa era do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, e afirmou que gostou. A partir daí, decidiu pedir apoio dos colegas no ministério, incluindo Guedes. Ele defendeu o Pró-Brasil como um horizonte de dez anos e que não era um plano de governo, e sim de Estado.

 

Acrescentou que as ações previstas abrangeriam segurança jurídica, retomada de obras paralisadas, crédito, produtividade, defesa, capacitação, entre outros itens.

 

Guedes afirmou que a ideia era bem-vinda, desde que não previsse recursos públicos. E disse que a ideia de intervenção do Estado para permitir a retomada da economia e reduzir desigualdades regionais tem as digitais de Rogério Marinho:

 

— Acho o discurso bom, mas a gente tem que tomar cuidado e reequilibrar as coisas. Não pode um ministro, para querer ter um papel preponderante este ano, destruir a candidatura do presidente, que vai ser reeleito, se seguirmos o plano das reformas estruturantes originais. Não podemos nos iludir. O caminho desenvolvimentista foi seguido e o Brasil quebrou. A política foi corrompida e a economia estagnou, através do excesso de gastos públicos. Como um governo quebrado vai investir?

 

Braga Netto respondeu:

 

— Ninguém falou em investimento público, por enquanto. Falamos aqui em investimento privado.

 

O ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, ficou ao lado de Guedes na discussão. Defendeu ações para dar um fôlego maior à iniciativa privada, para que os empresários possam investir e o governo atuar como mediador.

 

Já Rogério Marinho disse que sua proposta é adotar medidas, não necessariamente permanentes, para ajudar a economia a se recuperar. Argumentou que é o que está sendo feito por muitos países no contexto da pandemia e que situações extraordinárias requerem remédios extraordinários e de forma circunstancial:

 

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— Peço mentes abertas e que os dogmas sejam colocados de lado neste momento. Tenho visto governos extremamente liberais preparando programas de reconstrução, levando em consideração a necessidade de que o Estado nacional passa a ter papel diferente como tomador de risco neste momento em que há queda abrupta da liquidez. Caiu um meteoro sobre nossas cabeças. Por favor, não podemos começar uma discussão com verdades absolutas e com dogmas estabelecidos ao longo de cem anos. 

 

O Globo

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