A tomada de consciência é um dos caminhos que levam à mudança do comportamento alimentar
Durante todos esses anos trabalhando com obesidade e transtornos alimentares, aprendi muitas coisas importantes sobre a relação que estabelecemos com a comida, e a principal delas é que perder peso é um caminho árduo que envolve muito amor. Parece irônico eu falar sobre amor e comida já que não tem como desvincular a comida dos afetos, e por isso a complexidade aumenta, assim como explodem propostas de perda de peso divulgadas por aí.
Vivemos um círculo vicioso que nos leva a consumir coisas, sejam roupas, sapatos, carros, e a comida é somente um dos aspectos que utilizamos na tentativa de sentir alegria e satisfação. É importante pensar sobre essa questão com mais profundidade, pois ainda hoje buscamos controlar o desejo de comer como se fosse uma simples questão de força de vontade, desvinculado totalmente da relação emocional.
Há tempos falamos de como a comida serve como um amortecedor emocional, desta forma ela é utilizada com um paliativo para aliviar o estresse, a ansiedade, a tristeza, raiva, solidão, o medo, mesmo que o efeito dela seja somente temporário. Porém, mesmo sabendo que a comida não tem essa finalidade, continuamos a comer como se precisássemos tapar um buraco interno que não tem fim.
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Sempre digo aos meus pacientes que não colocamos suco de laranja no tanque do carro, pois ele precisa de combustível para funcionar, porém, mesmo assim, queremos alimentar o nosso corpo com quantidades e escolhas alimentares que irão impactar negativamente a nossa saúde e autoimagem. Mesmo com toda a consciência de que esse não é o caminho, continuamos a buscar recursos que não solucionarão as nossas dores, assim como pílulas e procedimentos mágicos.
Infelizmente não fomos ensinados a resolver o que nos incomoda, não sabemos dar limites, dizer não, falar de forma assertiva sobre o que sentimos, a nos respeitar e, principalmente, a nos amar de verdade. Achamos que uma prótese de silicone irá resolver questões de autoestima, uma roupa de uma determinada marca realmente agregará mais valor a quem somos, e assim passamos a vida consumindo e sendo consumidos.
Buscamos erroneamente nos curar através do externo, enquanto a cura está no interno. Vamos engolindo a vida, não a vivemos de verdade pois estamos amortecidos, então como parar de colocar para dentro da boca mais comida? Emagrecer requer mudanças internas profundas, é necessário rever a forma de lidar o eu interno, o autocuidado e a reconstrução da autoestima.
Por trás de todo comportamento autodestrutivo existem dores profundas mesmo que não conscientes. É importante lembrar que as dores emocionais nem sempre são originadas de situações pontuais que fazem sentido à mente racional, nos esquecemos de que somos impactados de acordo com as interpretações que damos aos fatos, inclusive na infância.
Quando entendemos que todas essas vivências determinam a nossa autoestima e aprendemos formas de lidar com as emoções e fatos da vida, vai ficando mais claro que é necessário se aprofundar, pois a comida nesses casos será somente um recurso originado da falta de amor-próprio. É preciso olhar para dentro de si mesmo com mais verdade, confrontando os monstros internos que infernizam a vida.
Fotos: Reproduções
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E assim, ao compreendermos os problemas em sua essência, desenvolveremos ferramentas internas mais assertivas para a perda de peso real. O processo é de reconstrução, aprender a amar e cuidar de verdade do nosso corpo e saúde, pois nada externo ou mágico fará isso por nós. Ao tomarmos a nossa vida em nossas mãos, dizemos sim ao que temos de mais sagrado, nesse momento a chave vira e a vida saudável chega para ficar.
Fonte: Estadão