01 de Maio de 2024 - Ano 10
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10/07/2018

Com greve, crescimento econômico de 1,5% neste ano já é visto como ‘teto do PIB’

Foto: Reprodução

Economistas revisam para baixo projeções de alta. Já há quem veja risco de recessão em 2019

A expectativa de que 2017 seria um ano de retomada da economia está sendo frustrada a cada novo indicador divulgado nas últimas semanas, principalmente de números que refletem os efeitos da greve de caminhoneiros. A avaliação é que a paralisação freou ainda mais um ritmo que já vinha mais fraco que o imaginado.

 

Já há quem veja um crescimento da ordem de 1,5% — consenso no mercado financeiro — como espécie de “teto” para a alta do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano. No início do ano, analistas chegavam a projetar avanço de 2,9%, e os mais otimistas arriscando previsões acima dos 3%, embalados pelo crescimento acima do esperado em 2017.

 

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— Hoje em dia, 1,5% seria o teto. É o que estamos projetando, mas esperando para ver. Em agosto (quando os efeitos da greve forem dissipados), vamos ver melhor qual é o cenário — destaca Luis Otávio Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil, que previa alta de 2,5% no início do ano.

 

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O mercado financeiro em geral começou o ano com previsões até mais otimistas, como mostra o boletim Focus, divulgado semanalmente pelo Banco Central. Na máxima do ano, entre o fim de fevereiro e o início de março, a mediana das projeções chegou a bater os 2,9%. As expectativas passaram a cair meses depois, com a dificuldade de recuperação do mercado de trabalho e despencaram de vez a partir da greve. No mais recente relatório, divulgado nesta seguna-feira, a mediana estava em 1,53%. No mesmo documento, os analistas elevaram pela oitava semana seguida a estimativa para a inflação oficial, que agora é de 4,17%. Para 2019, a previsão ainda é de crescimento de 2,5%.

 

 

Uma série de indicadores tem sustentado as revisões para baixo. No início do mês, a Anfavea, associação que representa as montadoras, informou que a produção de veículos recuou 20,2% em maio, frente a abril. O transporte de cargas teve queda de 27,7%, a maior em 19 anos, segundo a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR). A produção industrial recuou 10,9%, mostrou o IBGE na semana passada. Para Leal, do ABC, os números que refletem a paralisação são “a cereja do bolo” de uma retomada que já vinha decepcionando.


Grandes bancos também já revisaram suas projeções para baixo. O Bradesco atualizou sua previsão de crescimento de 2,5% para 1,5%. No Itaú, a projeção é de 1,7%. Até mesmo o Banco Central derrubou, na semana passada, a estimativa de crescimento deste ano de 2,6% para 1,6%.


— Há muitas incertezas tanto no cenário doméstico, com as eleições, quanto no externo, com a guerra comercial concreta iniciada pelo presidente Donald Trump. Além disso, a greve dos caminhoneiros trouxe prejuízo concreto para a indústria, por exemplo no setor de aves, onde o ciclo reprodutivo foi interrompido com a morte de muitas delas — avalia Thiago Xavier, economista que analisa atividade econômica na consultoria Tendências.


Em SP, empresa perde 28,5% da receita com greve


O problema, destacam os especialistas, é a consolidação de um ciclo vicioso. As incertezas travam investimentos, que adiam uma retomada do mercado de trabalho e interferem no avanço do consumo, uma das principais bases do PIB brasileiro.


— O cenário é adverso para recuperação do investimento. Alguns projetos que foram desengavetados na indústria, no primeiro semestre, foram apenas para modernizar ou manter a competitividade. Não se viu investimento de porte para ampliação da capacidade. E isso não deve acontecer até o final deste ano — aponta o economista Rafael Cagnin, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI).


É um panorama que afeta o caixa de empresas como a Cabovel, do setor de autopeças, com cinco unidades em São Paulo (duas em Osasco e três em Vinhedo). A fabricante de cabos para aceleradores, embreagens e freios viu sua receita cair 28,5%, no mês de maio, consequência da greve dos caminhoneiros. A companhia deixou de receber componentes e matéria-prima para as linhas de produção, que diminuiu de ritmo, embora não tenha parado totalmente porque boa parte dela já estava programada. A Cabovel, que exporta para toda a América Latina, Estados Unidos e Alemanha, também não conseguiu escoar seus produtos até o Porto de Santos.


— Do dia 21 de maio, data do início do movimento, até o final do mês não faturamos nada. E este período do mês representa 30% de nossas receitas — conta Nasser Barbosa, gerente comercial de reposição da empresa, lembrando que se o movimento durasse mais uma semana as fábricas ficariam paralisadas por falta de material.


Xavier, da Tendências, destaca que a confiança do consumidor e dos empresários também recuou com a fragilidade do governo Temer em negociar com os grevistas, tabelando o valor dos fretes.


— Isso pode abrir espaço para outras categorias fazerem reivindicações — diz o economista.


Saques do PIS/Pasep ajudam


Um dos únicos fatores com impacto positivo na economia, no segundo semestre, é a volta do saque dos recursos do PIS/Pasep, que pode impulsionar um pouco o consumo, já que as famílias estão menos endividadas do que quando receberam os recursos do Fundo de garantia Por Tempo de Serviço (FGTS), no ano passado.


— Na nossa estimativa, se 60% desses recursos forem para o consumo, haverá impacto de 0,3% no PIB. Esse impacto já está embutido na nossa previsão de crescimento de 1,7% — diz Xavier, da Tendências.


No banco Santander, a estimativa de crescimento do PIB foi revisada de 3,2% para 2%, principalmente por conta dos dados frustrantes da indústria e da recuperação mais lenta do mercado de trabalho, especialmente nas categorias onde o emprego é formal.


— Entre impactos diretos, que são vistos na produção industrial, por exemplo, e indiretos, como a queda da confiança dos consumidores avaliamos uma queda de 0,7 ponto percentual no PIB deste ano, que já está contemplada em nossa previsão — diz o economista Rodolfo Margato, do banco Santander, que cita ainda o cenário de incerteza trazido pela eleição.


Na Guide Investimentos, o crescimento da economia foi revisado de 2% para 1,8% e o viés continua sendo de baixa. O economista da Guide Investimentos, Ignacio Crespo Rey, observa que a mediana das estimativas para o PIB apresentadas pelo boletim Focus caiu mais de 40% nos últimos dois meses, o que não é pouco. Ele lembra que os efeitos positivos da queda da taxa de juros Selic ainda não foram totalmente repassados à economia, o que pode contrabalançar um pouco os fatores negativos. Mas ele lembra que a incerteza segue alta, o que inibe o consumo e o investimento.


— O índice de incerteza calculado pelo Ibre/FGV de junho chegou a 125,1 pontos. Dada a média de 100,4 desde o início da série, hoje a incerteza está quase 25% acima do patamar histórico — afirma ele.


Risco de nova recessão


O banco suíço UBS revisou recentemente a estimativa de crescimento do PIB de 2,2% para 1,8%. Os motivos para essa revisão foram os dados mais fracos da atividade econômica no primeiro trimestre, que ficou em 0,4%, ante a previsão de 1%. A instituição financeira lembra que houve um ensaio de recuperação em abril, mas a paralisação dos caminhoneiros, em maio, causou impacto não só na atividade, mas também a confiança de empresários e consumidores.


Diante desse cenário, já há quem veja até o risco de uma nova recessão. Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, chegou a prever alta de 3% do PIB em 2018. Hoje, espera 1,9%, em um cenário sem reviravoltas políticas, o que considera “menos provável”. O cenário político vai determinar se 2019 será de crescimento ou até de novos números negativos, como em 2015 e 2016:


— Existe sim (risco de recessão), já para o próximo ano a depender de quem ganhar (as eleições). A economia ainda está muito frágil e qualquer desvio de rota nos joga em crise de novo. Talvez isso seja necessário para quebrar a espinha dorsal das corporações finalmente. Talvez só assim será claro que precisaremos, por exemplo, de uma reforma da previdência de verdade. Talvez a recessão que tivemos não tenha sido suficiente para quebrar os privilégios de Brasília e de quem se sustenta no Estado. Uma outra crise poderá ser necessária para deixar isso incontornável.

 

O Globo

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