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31/05/2018

Pais não percebem excesso de peso dos filhos, diz pesquisa

Foto: Shutterstock / DementevaJulia

Consumo exagerado de ultraprocessados é uma das razões da obesidade infantil

A auxiliar de saúde bucal Sheila Gonçalves tomou um susto certa vez, ao levar a filha ao pediatra. Maria Clara tinha dois anos e meio, bochechas rechonchudas e a disposição de qualquer criança saudável. Segundo o médico, no entanto, estava sete quilos acima do peso considerado saudável:

 

— Eu fiquei surpresa e decepcionada comigo mesma — conta Sheila.

 

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Havia mais. Apesar da pouca idade, os exames atestavam que Maria Clara estava com colesterol alto e que era preciso mudar a forma como se alimentava. Desde que completara um ano, tomava leite acompanhado por farinhas adocicadas. A inclusão delas na dieta fora sugestão de parentes de Sheila, que achavam a menina muito frágil:

 

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— E eu, mãe de primeira viagem, achei que a ideia fosse boa — diz Sheila, com bom humor, mas uma pitada de desapontamento. — O médico falou que aquilo equivalia a dar a ela um pacote de biscoito doce. Ela era fofinha, mas sempre achei que estivesse saudável.

 

O equívoco é comum. Uma pesquisa recém-publicada, realizada por uma equipe da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), constatou que parcela significativa dos pais tem dificuldade para apontar se o peso dos filhos é normal ou não. No geral, erram — para menos:

 

— Os adultos têm dificuldade para perceber, precocemente, o excesso de peso infantil — afirma a nutricionista Sarah Warkentin, que liderou o estudo. — Isso pode ser ruim, porque uma criança com excesso de peso tem maiores chances de se tornar um adulto obeso e desenvolver doenças associadas à obesidade.

 

Sarah e sua equipe chegaram a essa conclusão depois de conversar com pais de 976 crianças, com idades entre dois e oito anos, que estudavam em colégios particulares de São Paulo e Campinas. Dados como peso e altura das crianças estavam disponíveis nas agendas escolares dos estudantes. Aos pais, foi aplicado um questionário. As perguntas versavam sobre os hábitos alimentares da criança e visavam saber se, na opinião dos pais, elas estavam “magras”, “muito magras”, com peso “normal”, “ligeiramente gordas” ou “gordas”.

 

As conclusões sugerem que os genitores são péssimos avaliadores da saúde nutricional dos seus pequenos: 48% dos entrevistados erraram na avaliação; desses, 45% subestimaram o peso da criança. A frequência do erro foi maior, inclusive, entre os pais das crianças mais gordinhas: 60% dos pais cujos filhos foram classificados como “extremamente obesos” pelos pesquisadores disseram achar que a criança tinha peso normal.

 

Segundo Sarah, não se trata de displicência parental, mas de questão cultural:

 

— Os pais avaliam o peso dos filhos por meio de comparações com os coleguinhas. Conforme o número de crianças com sobrepeso aumenta, essa noção de normalidade muda.

 

O problema é mais sério do que parece. Nas últimas décadas, a obesidade infantil cresceu de maneira explosiva. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, em 1975, 5,9% dos meninos e 8,5% das meninas brasileiras entre 5 e 19 anos tinham sobrepeso. Em 2015, o problema acometia 30% dos meninos e 26,6% das meninas.

 

Além disso, segundo Sarah, ainda existe a noção de que a criança com mais “dobrinhas” é a mais saudável, um resquício de épocas mais difíceis:

 

 

—A criança mais gordinha era vista como aquela que resistira a doenças e a quadros de desnutrição.

 

Mais atenção às meninas

 

Outro dado curioso do trabalho diz respeito a pais de meninos. Na amostra estudada pelos pesquisadores, eles demonstraram maior propensão a subestimar o peso dos rebentos. Quase o dobro de chances, quando comparados a pais de meninas.

 

— Os pais são mais atentos à variação de peso das meninas. Enquanto um menino maior é visto como um menino mais forte — diz Sarah.

 

Os achados brasileiros não são uma descoberta isolada. Dados semelhantes foram encontrados em estudos feitos no México e no Chile. Essa tendência parental ao equívoco é natural, mas preocupa:

 

— Os pais são os principais responsáveis por mudar os hábitos alimentares das crianças. Se eles demoram a perceber que há um problema, a criança pode ser prejudicada — alerta Sarah.

 

Segundo a nutricionista Lara Natacci, especialista em comportamento alimentar, a resistência dos pais a reconhecer o peso real dos filhos pode ser reflexo também de um temor:

 

— Se a criança tem sobrepeso, os pais sentem que, de certa forma, falharam.

 

Lara percebe isso no consultório: cresceu o número de crianças trazidas pelos pais para acompanhamento nutricional:

 

—A maioria chega por indicação de um pediatra. Geralmente, quando a criança já está com algum problema de saúde.

 

Foi mais ou menos esse o roteiro da manicure Beatriz Garreta e de seu filho Vinícius, de 11 anos. Ela conta que sabia que o menino era “gordinho”, mas achava que estava tudo bem:

 

— Até que um endocrinologista me disse que o Vinícius tinha obesidade mórbida. Fiquei arrasada.

 

Hoje, Vinícius segue uma dieta que limita artigos como refrigerantes — que bebe só em festas, “e olhe lá” — e treina muay thai.

 

Segundo Lara, o melhor a fazer, nesses casos, é envolver toda a família no menu da criança:

 

 

— E, inclusive, deixar que ela participe da elaboração desse cardápio.

 

Para a nutricionista, esse contato com a comida pode despertar o interesse da criança por alimentos diversificados e afastá-la do consumo excessivo de ultraprocessados — produtos como biscoitos recheados e sopas prontas, inundados de açúcar, sódio e conservantes. E apontados como alguns dos principais responsáveis pelo crescimento da obesidade infantil.

 

— Hoje, mais de 30% das crianças de São Paulo têm sobrepeso. E esse número não dá sinais de que vai cair — diz ela. — Precisamos mudar o padrão alimentar dessas crianças.

 

O Globo

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