Diretor e roteirista Matt Reeves sofre para concluir trama de nova versão do personagem, que tem agora Robert Pattinson como herói da DC.
Com quase três horas de duração, não seria bem exagero falar que o novo "Batman", que estreia nesta quinta-feira (3) nos cinemas brasileiros, tem mais ou menos dois filmes dentro de si.
Na primeira metade, a nova versão do homem-morcego com Robert Pattinson (de "O farol", mas mais conhecido mesmo pela saga "Crepúsculo") com o capuz e a capa, é uma das melhores adaptações da estética e da linguagem dos gibis.
A narração afetada, a história com algumas idas e vindas pontuais mas certeiras, os cenários que retratam um mundo fictício muito vivo. Tudo lembra alguns dos capítulos mais memoráveis do herói da DC nos quadrinhos e graphic novels (as obras mais fechadas e, muitas vezes, mais "adultas" do personagem).
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Já a parte final é uma grande representação de uma das maiores características do diretor Matt Reeves (dos últimos dois filmes da trilogia "Planeta dos macacos").
Ao assumir a quarta versão cinematográfica do Batman e dividir o roteiro com Peter Craig ("Bad Boys para sempre"), o cineasta mostra seu talento em construir filmes com visuais e narrativa atraentes, mas que, com o tempo, parecem não saber muito bem para onde ir, com conclusões arrastadas e até frustrantes.
Nas sombras mais um vez
"Batman" serve como um recomeço – sim, mais uma vez – para o personagem nos cinemas. Pelo menos não é outra história de origem, com um homem-morcego já estabelecido em sua luta contra o crime na cidade de Gotham – o público finalmente é poupado de mais uma cena de um colar de pérolas partido em câmera lenta em um beco escuro.
Com a investigação de uma série de mortes cometidas por um assassino serial que deixa pistas para o protagonista sob a alcunha de Charada (Paul Dano), o enredo constrói uma boa desculpa para trazer um dos fundamentos do personagem menos retratados nos cinemas.
Este é, afinal, o maior detetive do mundo (dos quadrinhos da DC).
Por outro lado, fãs das HQs podem estranhar as mudanças no vilão, que deixa para trás sua origem cerebral de gênio do crime para vestir uma roupagem mais parecida a de psicopatas violentos como o de "Seven - Os sete crimes capitais" (1995).
No fim, ele ainda assume um lado incel/alt-right um pouco mais perturbador do que talvez até os próprios autores gostariam.
Pattinson consegue um bom equilíbrio com seu Batman. Por sorte, não há qualquer tentativa de uma voz gutural como a de Christian Bale na trilogia de Christopher Nolan.
Infelizmente, isso tem um custo, com um Bruce Wayne, o alter ego do herói, mais nas sombras do que o próprio Cavaleiro das Trevas.
Isso até ajuda a esquecer um pouco o fato de que o personagem é, no fim das contas, um bilionário que bota armadura para esmurrar criminosos sem consequências, mas também enfraquece um ponto importante do plano mirabolante (e um pouco tonto) do antagonista.
Elenco prodígio
Erros e acertos da escalação de de Pattinson e Dano à parte, "Batman" conta com um dos melhores elencos de todos os filmes do herói.
Zoë Kravitz ("Big little lies") entrega a Mulher-Gato mais atraente e instigante desde Michelle Pfeiffer em "Batman: O Retorno" (1992), e Colin Farrell ("O lagosta"), ainda um dos atores mais subvalorizados de Hollywood, rouba todas as suas cenas como o Pinguim.
Jeffrey Wright ("007 - Sem tempo para morrer"), por sua vez, apresenta sua habitual competência como um novo futuro comissário Gordon, e consegue se sair bem da inevitável comparação com a interpretação de Gary Oldman no papel.
Além deles, participações de luxo como as de Peter Sarsgaard ("Lanterna Verde") e John Turturro ("The night of") ajudam a manter o público engajado mesmo nos momentos mais arrastados da trama, que começa forte mas aos poucos mostra que não sabe muito bem para onde ir.
Fotos: Reprodução
Tempo demais
E este é o principal problema de "Batman", que também sofre de uma escuridão perpétua que ultrapassa em muito o argumento de que o herói se favorece mesmo nas sombras.
Um roteiro deve conquistar o direito de manter uma duração tão grande, e a história de Reeves certamente não chega lá.
Tudo bem, a proposta de dissecar a complexa história política e criminal da cidade junto dos planos do vilão era ousada, mas cabe aos autores a obrigação de manter todos os seus elementos coesos, sob o risco de perder o interesse dos espectadores.
Quando mais um dos muitos antagonistas é superado e o objetivo do Charada ainda não está nem perto de ser esclarecido, é um pouco inevitável se sentir tal qual o meme de John Travolta olhando de um lado para o outro enquanto segura seu sobretudo em "Pulp Fiction" (1994).
Para piorar, a conclusão repentinamente toma tons grandiosos demais, em especial para um herói urbano como o Cruzado de Capa (um dos muitos apelidos carinhosos do personagem), com muitas coisas – pouco interessantes – acontecendo ao mesmo tempo.
Ironicamente, também é um final muito aquém das promessas, que foge das promessas feitas pelo enredo e deixa um gosto amargo após longas horas de espera.
"Batman" é um ótimo recomeço para o personagem nos cinemas, mas que não sabe direito como e quando terminar.
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O filme tem elementos bons o suficiente para garantir o futuro para mais uma franquia, só precisa aprender com seus muitos e profundos erros – pelo menos ele tem tempo de sobra para isso.
Fonte: G1