Versão mais intensa dos efeitos pré-menstruais causa desequilíbrio emocional e afeta relações afetivas
A educadora parental Andressa Eberhardt, 33 anos, ficou aos prantos após finalmente receber o diagnóstico do transtorno disfórico pré-menstrual (TDPM), uma explicação para as crises de choro e de raiva repentinas e o sentimento desconcertante de autodepreciação que experimentava na semana que antecede a menstruação. Os sintomas se agravaram anualmente até a criadora de conteúdo buscar ajuda médica.
Apesar de pouco conhecido, o diagnóstico veio como um conforto para o mal-estar mensal que excede os sintomas da conhecida tensão pré-menstrual (TPM).
— É muita energia mental despendida para conviver com o TDPM. Tinha os sintomas de sete a 15 dias antes de menstruar. Era uma luta para me restabelecer, um esforço imenso por não estar na condição normal. Quando conseguia (me recuperar), entrava de novo.
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Faz um mês desde que começou o tratamento. Sem menstruar, a influenciadora afirma estar se sentindo mais leve. Ao perceber que “não era frescura, mas sim uma doença séria que precisa de tratamento”, ela permitiu que os sentimentos, constantemente invalidados pelas pessoas próximas, fossem valorizados.
Andressa é uma das milhares de portadoras da TDPM, presente em 3 a 8% das brasileiras. O transtorno é considerado uma forma mais grave da TPM, segundo a Federação das Associações Brasileiras de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). Popularmente chamada de “TPM”, a síndrome pré-menstrual (SPM) afeta cerca de 80% das mulheres em idade reprodutiva. São mais de 150 sintomas, entre os mais comuns: irritabilidade, cansaço, dor de cabeça e retenção de líquidos.
Presidente da Febrasgo, a ginecologista Maria Celeste Osório Wender descreve a síndrome como “um conjunto de sinais e sintomas físicos e emocionais que aparecem somente na segunda fase do ciclo, nos dias pré-menstruais”. A profissional completa que eles comprometem o bem-estar da mulher, porém reforça a diferença das duas condições:
— O TDPM é um espectro muito severo da SPM, em que os sintomas são incapacitantes e trazem prejuízos maiores para a vida da mulher. É um transtorno já classificado na área da psiquiatria.
Os principais sintomas do transtorno são: instabilidade emocional, irritabilidade extrema, conflitos interpessoais frequentes, tristeza, falta de esperança, pensamentos negativos acerca de si mesma, dificuldade de concentração, falta de interesse nas atividades do dia a dia, alterações no sono, ansiedade, tensão e sensação de estar “à flor da pele”.
— O TDPM não é tão comum, mas é muito sofrido. Os sintomas podem aparecer a qualquer momento após a primeira menstruação. E costumam diminuir depois da menopausa. Acontece durante o período reprodutivo feminino — diz a psicóloga Larissa Durães, mestre em Psicologia da Saúde e do Desenvolvimento.
TRATAMENTO
A condição é diagnosticada por um psicólogo ou psiquiatra. E, embora não tenha cura, é possível amenizar os sintomas.
— É uma condição que, com certeza, pode ser tratada. Há medicamentos bastante eficazes para o tratamento, como os anticoncepcionais, que podem melhorar essas manifestações. A terapia cognitivo-comportamental também pode ajudar — avalia Wender.
O psiquiatra Rafael Lopes, cuja área de atuação é justamente a saúde mental feminina, reforça que não há por que esperar até a menopausa para melhorar a qualidade de vida.
A médica veterinária Thayana Lopes, 27 anos, descreve que as portadoras se tornam “uma outra pessoa” durante os 15 dias que antecedem a menstruação. A baiana foi diagnosticada depois de passar por oito profissionais. Até hoje, os sintomas físicos e mentais se manifestam, apesar de estarem mais controlados.
— O impacto maior é emocional. Lido não apenas com o que é proveniente das oscilações hormonais da TPM, mas com o peso e o desgaste de ter o transtorno. É pesado e cíclico — lamenta.
A veterinária defende que, “quanto mais cedo descobrir o TDPM, melhor será sua qualidade de vida”, ao incentivar que outras mulheres busquem ajuda. Thayana também critica que a sociedade não reconheça a seriedade do transtorno.
— Foram anos cansativos sem saber o que tinha. Antes de receber o diagnóstico e fazer o tratamento, acreditei que minha vida seria um eterno fracasso. Não tinha energia para fazer nada com todos os sintomas. Não conseguia levar meus projetos para frente. Minhas relações eram todas conturbadas — desabafa.
A psicóloga Natalia Boechat reforça que os sintomas impactam bastante a convivência da portadora com outras pessoas.
— A deterioração transitória das relações é um reflexo importante dos sintomas na vida da mulher. Na maioria dos casos, ela se arrepende das reações de impulsividade e irritabilidade, comprometendo e minando a convivência entre seus pares.
Boechat aconselha que as pacientes tenham um momento de resguardo durante a fase lútea, que ocorre após a ovulação e antes da menstruação. O ideal é suspender quaisquer escolhas importantes e não decidir nada temporariamente, já que as portadoras podem estar alteradas.
Fora os relacionamentos interpessoais, os prejuízos se alastram às áreas acadêmicas e de trabalho, segundo o psiquiatra Rafael Lopes.
PRECONCEITO
A psicóloga clínica Natalia Boechat ressalta que, durante séculos, a menstruação e a saúde reprodutiva feminina foram tratados como tabus. Com pouca ou nenhuma autonomia, as mulheres foram acostumadas a não tratar de assuntos referentes à saúde sexual. Assim, a crença de que elas se tornavam instáveis e ineficientes durante a fase lútea contribuiu para o afastamento das oportunidades no mercado de trabalho, sobretudo em posições de destaque, pondera a profissional.
Natália reflete que foi apenas em 2013 que o TDPM foi inserido como subtipo da depressão.
— É pouquíssimo tempo. Por isso, ainda é pouco conhecido entre os profissionais, as mulheres afetadas e a população geral — argumenta. E aconselha às portadoras: — Elas, primeiramente, precisam conhecer este transtorno. Em seguida, reconhecer esta condição em si, caso haja, mas também é importante entenderem a necessidade de se colocar como prioridade durante a fase.
Por outro lado, a psicóloga Larissa Duraes ressalta o olhar social de “exagero” para a mulher e as condições relacionadas ao bem-estar feminino.
Fotos: Reprodução
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— Pode ser confundido com exagero, que “ela está sendo muito emocionada". No senso comum, ninguém sabe que esse transtorno existe. Acha-se, então, que a TPM é exagerada, mas há casos realmente graves.
Fonte: O Globo
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