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27/08/2022

Césio-137 em Goiás colocou o Brasil no mapa de piores acidentes radioativos do mundo

Foto: Reprodução

O desastre do césio-137 produziu cerca de 6.000 toneladas de resíduos, recolhidos e enterrados em um centro preparado para isso

Dois catadores de lixo de Goiânia, Goiás, entraram em uma clínica abandonada em setembro de 1987. No local, eles encontraram uma máquina com césio-137, que acabou provocando o pior desastre nuclear do mundo desde Chernobyl, em 1986, e o maior acidente radioativo da história fora de uma instalação nuclear.

 

Os catadores Wagner Pereira e Roberto Alves retiraram a parte superior da máquina, que era uma unidade de radioterapia, e levaram para casa usando um carrinho de mão.

 

Usando chaves de fenda, eles abriram a pesada caixa de chumbo e encontraram um cilindro que continha 19 gramas de césio-137, uma substância altamente radioativa. Os homens venderam a cápsula para um ferro-velho, propriedade de Devair Ferreira.

 

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De acordo com um relatório publicado um ano depois pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), em pouco tempo, Pereira e Alves começaram a sofrer com vômitos frequentes, mas na época acreditaram que era por causa de uma intoxicação alimentar.

 

Com diarreia, tontura e com uma mão inchada, Pereira procurou atendimento médico no dia 15 de setembro. Os sinais apontavam um tipo de reação alérgica provocada pela ingestão de alimentos em condições ruins.

 

Três dias depois, Ferreira entrou na garagem e observou um brilho azul emanando da cápsula que havia comprado como sucata. Ele acreditou que o pó poderia ser valioso, como uma pedra preciosa, e levou o cilindro para casa.

 

Após isso, ao longo de três dias, vizinhos, parentes e conhecidos foram convidados a ver a cápsula.

 

A CONTAMINAÇÃO COM CÉSIO-137

 

 

Um amigo de Ferreira o visitou e, usando uma chave de fenda, extraiu fragmentos do césio-137, do tamanho de grãos de arroz, que se desintegravam facilmente e viravam pó.

 

Ferreira distribuiu pedaços para a família. Em 24 de setembro, Ivo Ferreira, irmão de Devair, levou alguns fragmentos do césio-137 para casa e eles foram colocados na mesa. Sua filha de seis anos, Leide das Neves Ferreira, os tocou enquanto comia, assim como outros familiares.

 

Após isso muitas pessoas adoeceram, todas elas com os mesmos sintomas: diarreia, vômitos, febre alta e queda de cabelo. Vale destacar que algumas pessoas esfregaram o pó radioativo sobre a pele.

 

A primeira pessoa a suspeitar que a cápsula com o pó brilhante estaria causando o problema foi María Gabriela Ferreira, mulher do dono do ferro-velho.

 

De acordo com Sueli de Moraes, uma vizinha que também foi contaminada, “María Gabriela pôs o cilindro em um saco plástico e o levou, de ônibus, para um escritório de saúde do governo local, onde ninguém sabia o que era, mas o guardaram”, disse em entrevista à BBC.

 

O FÍSICO

 

Após 15 dias desde o início da contaminação, os médicos começaram a suspeitar de um envenenamento por radiação.

 

O físico Walter Mendes Ferreira foi o responsável por examinar o dispositivo. Ele pediu emprestado um detector de radiação de uma agência federal de prospecção de urânio e foi até o escritório de saúde.

 

“Quando estava a cerca de 80 metros do escritório, o detector começou a agir de forma estranha e pensei que estivesse com defeito”, disse o físico à BBC.

 

Por isso, ele pediu outro detector e retornou ao escritório. “Mais uma vez, a 80 metros, (o detector) começou a ficar saturado. Isso significava que ou estava em um lugar com um campo de radiação muito alto, ou que ambos os detectores estavam defeituosos.”

 

De acordo com Mendes, ele viu um bombeiro saindo do posto de saúde carregando o cilindro para jogá-lo no rio.

 

“Eu disse: ‘Pelo amor de Deus, não!’. Imediatamente, evacuei o posto de saúde e perguntei aos trabalhadores locais de onde vinha aquilo. Eles me disseram que uma mulher de um ferro-velho o havia levado. Fui ao ferro-velho e antes de entrar, detectei radiação por todos os lados”, lembra ele.

 

PÂNICO

 

 

O físico fez alertas às autoridades e instâncias públicas, como a Comissão Brasileira de Energia Nuclear (CNEN). O seu objetivo era deter a contaminação e evitar o pânico. No entanto, os temores sobre a radiação se espalharam pelo Brasil.

 

Mendes contou que foram usados ônibus da polícia, com o interior forrado por chapas de plástico, para levar os possíveis contaminados para um estádio de futebol vazio. No local, eles ficaram em barracas de acampamento.

 

Essas pessoas foram examinadas e muitas receberam alta após tomarem banho com água e vinagre. No entanto, outras foram enviadas para um abrigo temporário ou um hospital local. Já os casos mais graves foram levados para um hospital militar no Rio de Janeiro.

 

De acordo com relatório da AIEA, repercutido pela BBC, “a comunidade médica em Goiânia se mostrou relutante em ajudar” e o medo da contaminação se estendeu pelo estado de Goiás.

 

Ao todo, mais de 110 mil pessoas foram examinadas. Entre elas, 249 delas tinham níveis significativos de material radioativo em seus corpos.

 

O ferro-velho e dezenas de casas foram demolidos. Além disso, objetos, pavimento de ruas inteiras, veículos, e até mesmo árvores e animais foram destruídos e descartados como lixo nuclear.

 

O desastre do césio-137 produziu cerca de 6.000 toneladas de resíduos, recolhidos e enterrados em um centro preparado, a 20 quilômetros da cidade.

 

AS VÍTIMAS FATAIS DO CÉSIO-137

 

Fotos: Reprodução

 

A primeira pessoa a morrer foi Leide das Neves Ferreira. Além dela, a tia María Gabriela Ferreira. Elas morreram de septicemia e sepse – infecções generalizadas, um mês depois da exposição ao césio.

 

A vizinha Sueli de Moraes contou que, quando os caixões chegaram ao cemitério, as pessoas começaram a atirar pedras e tijolos, tentando impedir o sepultamento.

 

“Os corpos foram descontaminados e eles decidiram enterrá-los em pesados caixões de chumbo como uma precaução adicional para tranquilizar as pessoas. Mas o que aconteceu foi o oposto. As pessoas entraram em pânico”, disse Moraes.

 

As outras duas vítimas fatais foram homens que trabalhavam no ferro-velho.

 

Os catadores de lixo Wagner Pereira e Roberto Alves sobreviveram, assim como o proprietário do ferro-velho Devair Ferreira.

 

No ano de 1996, cinco pessoas ligadas à clínica onde havia sido abandonada a máquina de radioterapia foram condenadas a três anos e dois meses de prisão por homicídio. Porém a pena foi diminuída após serviços comunitários.

 

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O governo passou a pagar pensões vitalícias para cerca de 250 vítimas. Depois, outras 2.000 pessoas, incluindo as que trabalharam nas unidades de emergência, também tiveram direito a essa pensão.

 

Fonte: BBC

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