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03/11/2023

Mais de dez países, a maioria na África, devem mais de US$ 2 bilhões ao Brasil, mas negociações estão paradas

Foto: Reprodução

Recriação do órgão que é encarregado de fazer acordos se arrasta no atual governo; para especialistas, demora prejudica novos negócios

Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe são dois dos países que recentemente disseram que querem sentar e negociar suas dívidas com o Brasil, segundo fontes do governo revelaram ao GLOBO, mas esta pauta não tem avançado em Brasília por uma única razão: o Comitê de Avaliação e Renegociação de Créditos ao Exterior (Comace) ainda não foi recriado.

 

Este grupo interministerial, que no governo anterior estava no Ministério da Economia e agora deverá ficar no da Fazenda, é o responsável pela negociação e pelo encaminhamento institucional desses assuntos. Mas a decisão final é do Senado.

 

Mais de US$ 2 bilhões (R$ 9,1 bilhões) entrariam hoje nas contas brasileiras se todos os 12 países devedores pagassem tudo o que devem ao Brasil. Nove deles são africanos, mas o que esses governos devem não chega a 14% do total a ser recebido. Se todas as dívidas fossem pagas, a maior parte deste dinheiro viria da Venezuela, que deve 57,6% do valor total. O segundo da lista de maiores devedores é Cuba (26,5%), onde o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve em setembro.

 

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O Comace foi criado na década de 1990, quando o Brasil enfrentava dificuldades para receber de volta dinheiro emprestado pelo governo militar a diversos países em forma de crédito para aumentar exportações. Com a alta dos juros nos Estados Unidos na década de 1970, esses países devedores passaram a enfrentar sérios problemas financeiros. O comitê já esteve também no Ministério do Planejamento, mas historicamente tem sido recriado a cada governo no da Fazenda. Isso depende do momento político do país e da força de cada ministério.

 

Em agosto, o presidente Lula visitou três países africanos. Um deles foi Angola, onde defendeu a volta de investimentos brasileiros no continente, destacando o país como um bom pagador.

 

— Vamos voltar a fazer financiamento para os países africanos. Vamos voltar a fazer investimento para Angola, que é um bom pagador das coisas que o Brasil investiu aqui. Angola sempre foi um país que nos deu a certeza de que cada dólar investido aqui seria ressarcido. E assim o fez — disse o presidente em Luanda.

 

Angola não está na lista de países que devem ao Brasil. Entre os devedores africanos, a maior dívida é a de Moçambique. O valor passa de US$ 143 milhões (R$ 798,5 milhões). Pelo cronograma de um novo acordo fechado entre os dois países no ano passado, duas parcelas já deveriam ter sido pagas. Mas o Senado — que deve autorizar a conclusão deste tipo de operação — disse à reportagem, por meia de sua assessoria, que não foi informado pelo Poder Executivo. Portanto, não há projeto de resolução sobre o caso e o Contrato de Reestruturação ainda não foi assinado. O governo Bolsonaro não finalizou o processo sobre a dívida de Moçambique.

 

Uma fonte que teve acesso às conversas em torno da pendência entre os dois países contou à reportagem que o acordo firmado previa pagamentos de parcelas semestrais, sendo que a primeira deveria ter sido paga em dezembro de 2022 e a última ficou prevista para junho de 2027.

 

Para o professor Mario Valente, do Núcleo de Relações Internacionais do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec/MG), como questões como a reforma tributária e o arcabouço fiscal foram priorizadas nos últimos meses, assuntos de política externa acabam ficando em segundo plano e esses processos dependem de como anda a relação entre o Executivo e o Legislativo.


— Há ainda um pente-fino sendo realizado sobre as ações do governo anterior. Eventualmente algum aspecto pode ser renegociado ou isso pode ser colocado em pauta em um momento mais propício — disse.

 

As fontes do governo ouvidas pela reportagem discordam que o assunto não esteja sendo priorizado pela atual gestão, já que, internamente, a avaliação e a análise dessas dívidas estão sendo feitas. Órgãos do governo, e até a Presidência, têm demandado informações sobre o assunto quando há missões oficiais em algum país devedor. O atraso para a formalização do Comace se dá por questões políticas, burocráticas e institucionais.

 

Na opinião de João Bosco Monte, fundador e presidente do Instituto Brasil-África (Ibraf), o Planalto pode e deve buscar uma solução para esse impasse com países devedores enviando ao Congresso uma possibilidade de negociação. As pendências existentes prejudicam a possibilidade de novos negócios porque impedem qualquer forma de apoio oficial brasileiro à exportação para os países devedores. Segundo o presidente do Ibraf, a negociação da dívida atual pode também dar condição de se pensar em alguma possibilidade de financiamento de empresas brasileiras para países como Moçambique.

 

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— No momento, Moçambique tem um ativo muito interessante que pode ser bom para o Brasil. A descoberta da bacia de gás no país, e ainda não explorada, pode abrir para empresas brasileiras oportunidades de exploração deste grande potencial econômico — destacou.

 

Fonte: O Globo

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