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03/02/2023

Novo Congresso: Lula fica mais dependente de Arthur Lira na Câmara e com dificuldade para mudanças constitucionais no Senado

Foto: Reprodução

Aescolha da cúpula do Congresso a cada início de legislatura tem o poder de determinar o destino do governo e calibrar a relação entre os Três Poderes. É a partir do resultado do confronto de forças no Legislativo que a agenda política do País se encaminha no período seguinte. Neste ano, esse ritual teve um significado simbólico ainda maior.

 

A reeleição de Arhtur Lira e de Rodrigo Pacheco como líderes da Câmara e do Senado, respectivamente, ocorreu sob a comoção dos ataques golpistas do 8 de janeiro e realçou as dificuldades que Lula enfrentará para governar, assim como os desafios que as instituições terão para resguardar a democracia.

 

Segundo na linha de sucessão presidencial, Arthur Lira conseguiu o maior triunfo na eleição de um líder da Câmara na história, e isso apenas dois anos depois de ser alçado ao posto com a ajuda de Jair Bolsonaro. Obteve 464 votos de um total de 509. Com o recorde, pavimentou o caminho para concentrar em suas mãos poder equivalente ao conquistado na gestão anterior. O resultado, sublinham aliados, é uma prova da força do deputado e do grau de influência dele sobre os colegas.

 

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“Lira tomou para si o poder de ditar os rumos da base que o governo tenta montar na Câmara. Já havia demonstrado, durante a votação da PEC da Transição, que quem tem votos na Casa é ele, e não Lula. Agora, o painel da eleição entrega uma prova cabal”, comenta um aliado do alagoano, sob reserva. O placar serve, ainda, para inibir investidas do PT contra o deputado adiante. É que Lira nutre desconfianças.

 

Recentemente, irritou-se com uma movimentação, atribuída a Gleisi Hoffmann, para construir uma candidatura alternativa ao nome dele. Em um rompante, segundo apurou ISTOÉ, chegou a entrar em contato com José Dirceu, que tem participado de negociações do PT fora dos holofotes, para reclamar e dar um recado duro. Depois disso, as tratativas cessaram. A ligação não foi desarrazoada. Dirceu ainda detém influência — a designação do filho dele, Zeca Dirceu, para a liderança do PT na Câmara, por exemplo, foi um gesto de Lula nesse sentido.


Daqui para a frente, apesar do apoio do PT a Lira, as votações delicadas serão negociadas uma a uma — seja com cargos, seja com a liberação de emendas. Lira quer um Império. Na gestão Bolsonaro, postos bilionários ficaram, em sua maioria, com pupilos de Ciro Nogueira, que atuava como ministro da Casa Civil. Agora, o manda-chuva da Câmara quer lotear postos com nomes de sua confiança. Estão no radar, por exemplo, o FNDE (R$ 53,1 bilhões), a Codevasf (R$ 874 milhões) e o Banco do Nordeste (R$ 34,6 bilhões).

 

O Dnocs, com um orçamento de R$ 810,8 milhões, já está no papo. Nomeado no governo anterior, o diretor Fernando Marcondes de Araújo Leão havia sido exonerado logo em 1º de janeiro, mas, após Lira intervir, a demissão foi tornada sem efeito e ele voltou à cadeira. A cobrança por postos no primeiro escalão também não deve demorar a chegar — durante a transição, é preciso lembrar, Lula negou ao presidente da Câmara o Ministério da Saúde, hoje chefiado por Nísia Trindade. Lira ainda deve barganhar pelo que sobrou do orçamento secreto.

 

Depois de o Supremo declarar o dispositivo institucional, o montante de R$ 19,4 bilhões reservado ao instrumento acabou dividido ao meio. A fatia que ficou com parlamentares, rateada entre emendas individuais, tornou-se impositiva. Já a outra metade está nas mãos de membros da Esplanada — a dinheirama, contudo, tende a ser usada em negociações.

 

Depois de ajudar no triunfo de Arthur Lira na Câmara, o governo distribuiu cargos contra a ameaça bolsonarista no SenadoA previsão de que Lula terá vida dura não é exagero. Com a ampliação da centro-direita no Congresso, a base dele na Câmara mostra-se muito fluida. A contabilidade extra-oficial aponta para um grupo cativo de somente 160 a 180 deputados — cerca, portanto, de somente um terço da Casa. Apesar de desejar focar na agenda econômica, o governo deve penar com o debate ideológico, porque as três maiores bancadas da Câmara — evangélica, da bala e do gado — estão repletas de bolsonaristas, interessados em colocar em pauta propostas sensíveis, como as que tratam do armamentismo e o garimpo.

 

Não bastasse a fragilidade da ala mais próxima a Lula, o chefe do Executivo, sublinham congressistas, perdeu a mão nas negociações da transição. O União Brasil é um exemplo de erro crasso. Segundo apurou ISTOÉ, embora o partido tenha abocanhado três ministérios, ministros como Alexandre Padilha aventam entre parlamentares que o governo tem a certeza da fidelidade de, no máximo, 20 deputados de uma bancada de 59.

 

Por causa disso, emissários de Lula tentam atrair para a base novas siglas. O diálogo com o Republicanos está a todo vapor. O presidente da legenda, Marcos Pereira, já sentou à mesa com Geraldo Alckmin e integrantes do alto escalão.

 

Durante a transição, o partido chegou a receber a oferta do Ministério da Pesca. Considerou pouco para fazer uma mudança tão brusca no próprio posicionamento, uma vez que participou da campanha de Bolsonaro. Passado algum tempo, porém, a perspectiva é de que a agremiação, que tem uma bancada de 41 deputados na Câmara, logo pule no barco de Lula. Em troca, está de olho, por exemplo, no Ministério do Turismo, que tem grande capilaridade e estrutura, na pasta da Indústria e Comércio, cujo assento está sendo apenas esquentado pelo vice-presidente, e no Ministério do Esporte — os dois últimos, aliás, já foram ocupados pelo próprio Marcos Pereira em gestões petistas.

 

Os 47 votos do PP são inteiramente controlados por Lira. Resta, do tripé bolsonarista, portanto, o PL, com 99 deputados. O governo viu com bons olhos a recondução de Altineu Cortes à liderança da sigla na Câmara — o liberal disputava internamente com nomes estridentes do bolsonarismo raiz, como Carla Zambelli. O PT entendeu ser uma sinalização de que Valdemar Costa Neto não pretende adotar uma linha de antagonismo radical. Altineu é visto, do Centrão à esquerda, como um nome “afável” e “conciliador”.

 

“Sou do diálogo. Nos posicionaremos como uma oposição responsável. Liderarei a bancada para votar contra projetos danosos ao País e a favor de propostas que coincidirem, ao menos em partes, como o que planejamos”, comenta Altineu. Indagado sobre a pressão da ala extremista do partido, o deputado contemporiza. “Cada um tem seu jeito de fazer política. Alguns fazem de forma mais forte ou contundente. Outros, como eu, de forma mais branda. Há respeito”.Enquanto a votação na Câmara transcorreu de forma previsível, a escolha no Senado tornou claras as dificuldades que Lula terá para aprovar projetos espinhosos.

 

Considerado franco favorito, Rodrigo Pacheco (PSD) foi reeleito com 49 votos, enquanto seu adversário, Rogério Marinho (PL), obteve 32. O resultado mais apertado do que o previsto deu um susto no governo. Uma eventual vitória de Marinho significaria uma trincheira valiosa para o bolsonarismo atacar a estabilidade das instituições. Além disso, sua candidatura acabou encarnando as expectativas dos aliados radicais do ex-presidente. Que os apoiadores das teses golpistas tenham reunido essa votação expressiva 24 dias depois do próprio Congresso ter sido vandalizado é um sinal no mínimo preocupante.

 

Na véspera da eleição, congressistas lembravam entre os corredores da zebra no pleito pelo comando da Câmara em 2005 — naquele ano, Severino Cavalcanti, antigo “rei do baixo clero”, triunfou sobre o candidato de Lula, Luiz Eduardo Greenhalgh. Temia-se um repeteco. É que, na véspera da disputa entre Pacheco e Marinho, mesmo aliados do pessedista admitiam a possibilidade de vitória do bolsonarista, a qual carimbaria o primeiro revés de Lula no Salão Azul. A previsão de retumbantes 55 votos de Pacheco caiu para suados 49 e, diante de uma maré favorável a Marinho, que atraiu até mesmo senadores do PSD, soou o alarme para traições que poderiam resultar no naufrágio do projeto de reeleição.

 

Contra essa ameaça, o governo mergulhou nas negociações, algo, aliás, que o presidente prometeu que não faria durante a campanha. Lula mandou ministros-senadores se licenciarem da Esplanada e retomarem os mandatos para votar no pessedista. O gabinete de Alexandre Padilha nunca foi tão movimentado.

 

A Secretaria de Relações Institucionais assegurou a nomeação de apadrinhados políticos de senadores, por exemplo, em superintendências de estatais, como a Codevasf e os Correios, e em diretorias de autarquias, a exemplo do DNIT. Além disso, os próprios congressistas da base do governo comandaram uma intensa movimentação. Em um almoço na casa de Weverton Rocha, desenhou-se o mapa das possíveis dissidências na base aliada para cobrar fidelidade.

 

No calor das articulações entre os governistas, aventou-se que três senadores da bancada de 10 do MDB, partido que comanda os ministérios do Planejamento, das Cidades e dos Transportes, se uniriam a Marinho. Líder da bancada no Senado, Eduardo Braga recebeu cobranças. “Se vira”, dispararam petistas para assegurar a integralidade do apoio da legenda a Pacheco.

 

A preocupação era justificável por uma série de razões. O Senado é capaz de impor derrotas consistentes ao Planalto. Em uma relação conflituosa com a Casa, o antecessor do petista penou — a título de exemplo, Bolsonaro teve de esperar cinco meses pela aprovação da indicação de André Mendonça ao Supremo. Lula, que já enfrentará dificuldades na Câmara, teria a agenda governista completamente comprometida se, no Senado, visse a pauta ser determinada por bolsonaristas.

 

A estabilidade institucional era outro fator de inquietação. Marinho sempre foi visto como um nome ponderado e de bom trânsito político —já cuidou da aprovação de temas espinhosos, como a Reforma da Previdência, por exemplo. Mas havia o receio de que ele sucumbisse à cobrança dos seus aliados, colocando em tramitação temas espinhosos, começando pelo impeachment de ministros do STF.

 

Com Pacheco à frente do Senado, ao contrário, há um indicativo de maior harmonia entre o Parlamento e o Supremo, posto que o pessedista atuou como fiador da democracia durante a tumultuada era bolsonarista. Aliados ponderam que, embora ele tenha proposto publicamente a discussão de matérias de interesse de congressistas críticos à Corte, como a fixação de mandato para ministros e regras para decisões monocráticas, não apoia as medidas e crê que as propostas não prosperarão.

 

Os governistas consideram que a eleição de Pacheco demonstra o nível de dificuldade que o Planalto encontrará adiante. É que, mesmo com a oferta de cargos e o sentimento antibolsonarista reforçado pelo atentado de 8 de janeiro, o presidente teve dificuldades em assegurar os votos necessários ao seu candidato. Os 32 votos conquistados por Marinho são suficientes para abrir uma CPI visando fustigar o governo, por exemplo. Contra essa ameaça, uma das principais missões do momento é a contenção do apetite de Alcolumbre.

 

O parlamentar do Amapá atuou na linha de frente das negociações pela reeleição do colega à presidência do Senado. Tudo, claro, de olho no futuro. Nos bastidores, frisava o interesse em ser reconduzido à chefia da CCJ e em disputar o comando do Salão Azul em 2025. Mas a sanha do ex-presidente do Senado prejudicou a candidatura de Pacheco, segundo aliados. “Alcolumbre quer tudo para si e isso incomoda muitos. Demonstra é que, na cúpula, sempre haverá espaço somente para ele e os seus”, critica um tucano, que pede anonimato.


Petistas buscam minimizar as dificuldades. Apostam que, na leva de votos da oposição, somente 16 representam de fato uma “resistência estridente” — é o número de bolsonaristas que as lideranças veem no Senado. “Mesmo no PL, estimamos ter conseguido três votos. É a sinalização de que, apesar de estar no partido de Bolsonaro, alguns senadores estão dispostos a dialogar quando necessário”, diz um congressista do PT, sob reserva. De tanto otimismo, os parlamentares frisam que os 49 votos depositados em Pacheco apontam que a gestão Lula consolidou maioria para aprovar PECs — algo ainda não atingido na Câmara.

 

Eles mencionam como prioridade a Reforma Tributária na Casa, uma das prioridades para o governo criar uma agenda positiva.Pouco antes da definição do Legislativo, do outro lado da praça dos Três Poderes, a abertura do ano Judiciário deu o tom emocional do momento. A presidente do STF, Rosa Weber, fez um discurso incisivo no plenário da Corte, que precisou ser inteiramente restaurado após ser transformado em escombros pelos bolsonaristas. Na cerimônia, a ministra deu recados importantes.

 

No mais duro, enfatizou que a Justiça punirá os autores da tentativa de golpe, inclusive dos seus incentivadores – não mencionou Bolsonaro, mas o ex-presidente era o objeto óbvio do comentário. Como a lembrar o desafio que será restabelecer o tecido institucional, Augusto Aras fez um pronunciamento tíbio, defendendo a duvidosa atuação recente da Procuradoria-Geral da República, órgão que comanda. A PGR, segundo ele, teve uma atuação “estrategicamente discreta, evitando que extremistas se manifestassem contra o regime democrático”. Ou seja, tentou reescrever a história isentando sua gestão da blindagem que permitiu a Bolsonaro e seus asseclas tentarem o golpe. Sem constrangimento, mas provocando vergonha alheia, chegou a declarar:

 

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“Democracia, eu te amo”. Já Lula, também presente no STF, defendeu uma relação harmoniosa entre os Três Poderes, enalteceu a “coragem do STF” e disse que o golpismo vem “da descrença na política”. O jogo pesado que se anuncia no Congresso mostra que há muito chão a percorrer para resgatar essa credibilidade.

 

Fonte: Revista Istoé

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