Trocas na Corregedoria também afetaram andamento de processos sobre ex-presidente, os filhos e integrantes da tropa de choque bolsonarista
As ações que tramitam no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre Jair Bolsonaro, seus filhos e outros aliados do ex-presidente entraram em banho-maria no tribunal após a saída de Alexandre de Moraes e de trocas na Corregedoria-Geral desde junho do ano passado.Bolsonaro e o seu candidato a vice, o ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto, já foram punidos pelo TSE e declarados inelegíveis até 2030. Mas as ações que podem levar à inelegibilidade do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e do vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ), além de dezenas de outros aliados, parecem ter sido deixadas de lado.
Desde a condenação do ex-presidente, nenhuma outra ação, nem contra Bolsonaro nem contra seus aliados, foi julgada pelo plenário do TSE. Quatro processos em que as alegações finais das partes já foram apresentadas e estão avançados para julgamento também ainda não foram pautados para análise dos sete integrantes da Corte Eleitoral.
Eles tratam do uso eleitoreiro do discurso de Bolsonaro na Assembleia Geral das Nações Unidas, marcado por ataques a Lula, e a viagem do ex-chefe do Executivo para o funeral da Rainha Elizabeth II, em setembro de 2022, em plena campanha.
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A ação a respeito dos ataques sistemáticos de Bolsonaro ao sistema eleitoral e os bloqueios da Polícia Rodoviária Federal para atrapalhar os deslocamentos de eleitores de Lula nas últimas eleições presidenciais também está parada, sem movimentação desde setembro do ano passado. O caso foi apresentado pela coligação do petista.
Levantamento feito pelo blog aponta ainda que, das 16 ações contra Bolsonaro movidas pelo PDT, pela coligação de Lula e pela senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), que também disputou a Presidência da República em 2022, apenas cinco já foram julgadas pelo plenário da Corte Eleitoral – todas no período em que Moraes chefiou o tribunal, entre agosto de 2022 e maio de 2024.
A inelegibilidade é resultado de três desses processos, dos quais dois foram julgados em conjunto. Eles tratavam da reunião com embaixadores para lançar suspeitas infundadas sobre o sistema eletrônico de votação, e do uso eleitoreiro das comemorações do Bicentenário da Independência. Nesse segundo caso, Braga Netto também foi condenado à inelegibilidade.
“A verdade é que parece que o TSE se contentou com a cassação dos direitos políticos de Bolsonaro. Depois do julgamento da ação do PDT pela reunião com os embaixadores e do 7 de Setembro, não houve mais nada”, critica o advogado Eugênio Aragão, que atuou na defesa da campanha do PT e ajudou na elaboração de algumas das ações que ainda aguardam julgamento.
Ao deixar o TSE, Moraes passou o bastão para a ministra Cármen Lúcia, que vai comandar a Corte até junho de 2026.
“A postura do TSE está na contramão dos outros órgãos do Poder Judiciário, como o Supremo, a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República, que estão empenhados em elucidar os fatos da última campanha presidencial”, diz uma fonte que acompanha de perto os desdobramentos dos casos.
Nos bastidores, a inércia do TSE tem sido associada à atitude de Cármen Lúcia, de “jogar parado” e evitar conflitos com outros poderes. Outras ações politicamente explosivas que podem levar à cassação de lideranças bolsonaristas, como o senador Jorge Seif (PL-SC), e o governador de Roraima, Antonio Denarium (PP), também caíram no limbo da Corte.
Esses dois julgamentos já foram iniciados, mas foram suspensos antes da contagem dos votos dos ministros – o de Seif, sob Alexandre, e o de Denarium, na gestão Cármen – e seguem sem previsão de serem retomados.
A NOVA CORREGEDORA
As mudanças na Corregedoria do TSE também impactaram o andamento dos processos contra Bolsonaro e seus aliados. A relatoria das ações de investigação judicial eleitoral (Aije) são, por força de lei, de responsabilidade dos ministros que assumem a Corregedoria.
Na época de Moraes, o ministro do Supremo atuava em sintonia com Benedito Gonçalves, que imprimiu um ritmo célere na investigação dos casos, indo atrás de provas e autorizando o compartilhamento de informações com os inquéritos de Moraes que tramitam no STF.
Com a saída de Benedito, e o fim da presidência de Moraes, a Corregedoria parou nas mãos de Raul Araújo, que deu voto para absolver Bolsonaro nos dois casos em que foi condenado no plenário.
Em setembro do ano passado, Raul mandou arquivar uma ação da coligação de Lula contra Bolsonaro que alegava falta de isonomia na cobertura da Jovem Pan nas eleições de 2022.
As demais ações não avançaram com Raul, nem com a atual corregedora, Isabel Gallotti, que assumiu a relatoria dos processos em setembro do ano passado. Os dois são considerados ministros conservadores, que atuam fora da órbita de Moraes – e mais próximos do bolsonarismo.
Durante o governo Bolsonaro, o marido de Gallotti, ministro Walton Alencar, do Tribunal de Contas da União (TCU), atuou nos bastidores para tentar convencer o então presidente da República a indicá-la ao STF, mas ela acabou preterida.
Na véspera do segundo turno das últimas eleições presidenciais, Gallotti contrariou o PT e os colegas do TSE ao conceder a Bolsonaro um direito de resposta ao programa de Lula, que havia relacionado uma fala do adversário sobre querer “todo mundo armado” ao aumento de casos de feminicídio e acidentes domésticos com armas de fogo.
A decisão de Galotti acabou sendo suspensa pelo plenário do TSE numa sessão extraordinária convocada às pressas, a dois dias das eleições.
A corregedora, que também atua no Superior Tribunal de Justiça (STJ), ainda foi confrontada recentemente com os desdobramentos de uma investigação de um suposto esquema de venda de sentenças e de informações privilegiadas na Corte.
Conforme informou O GLOBO, um dos diálogos encontrados envolve uma citação ao servidor Daimler Alberto de Campos, que foi chefe de gabinete de Gallotti. “Ela decidiu submergir”, diz um interlocutor da ministra no TSE.
Pelo visto, a submersão incluiu os processos de Bolsonaro.
Procurada pela equipe da coluna, Cármen Lúcia não se manifestou. Já Gallotti informou que assumiu a Corregedoria em setembro do ano passado, “quando em curso o período eleitoral” de 2024, “cujos processos prioritários eram aqueles do pleito corrente”.
A Corregedoria-Geral, no entanto, tem estrutura e assessorias próprias, independente do gabinete da ministra, e não recebe processos sobre as eleições municipais.
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Gallotti também alegou que herdou as ações de Bolsonaro “sem julgamento” após a “conclusão” da passagem de Raul Araújo, responsabilizando nas entrelinhas o antecessor pelo andamento lento dos casos até aqui.
Fonte: O Globo