Abuso de medicamentos em serviços de saúde e na produção de alimentos traz risco de resistência
A resistência antimicrobiana é um grande desafio de saúde pública no século XXI. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), ela está diretamente ligada a cerca de 1,27 milhão de mortes anuais, com quase 5 milhões de mortes atribuíveis indiretamente a suas complicações. Se não for adequadamente combatida, poderá causar danos irreversíveis, comprometendo os avanços modernos no tratamento de doenças infecciosas e transformando infecções comuns em ameaças letais.
O uso excessivo e inadequado de antibióticos, tanto na medicina humana quanto na agropecuária, é um dos principais fatores que impulsionam essa resistência.
O consumo de antibióticos em animais de produção, por exemplo, já corresponde a 73% de todos os antimicrobianos utilizados globalmente. Esse uso indiscriminado cria um ambiente propício para o surgimento e disseminação de bactérias resistentes, não apenas entre os animais, mas também nos seres humanos.
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Os efeitos da resistência vão além da saúde pública. Se continuar crescendo sem controle, países de baixa e média renda sofrerão perdas econômicas significativas. Estima-se que, até 2050, essas nações poderão perder mais de 5% de seu produto interno bruto (PIB), um total de US$ 100 trilhões, devido ao aumento dos custos de internação, tratamentos prolongados e a incapacidade de trabalho.
Tecnologias e práticas inovadoras estão sendo desenvolvidas para mitigar esse problema. Uma delas é o uso da inteligência artificial (IA) para prever a suscetibilidade antimicrobiana de bactérias e otimizar o uso de antibióticos. Sistemas de IA podem analisar grandes volumes de dados, permitindo que médicos escolham tratamentos mais eficazes e personalizados, reduzindo o uso de medicamentos de amplo espectro que contribuem para a resistência.
Outra área de grande inovação é o desenvolvimento de terapias alternativas aos antibióticos tradicionais, como as que usam fagos. Esses vírus, que infectam e destroem bactérias, têm se mostrado promissores no combate a infecções resistentes, particularmente aquelas que formam biofilmes e são de difícil tratamento com antibióticos convencionais.
Além disso, o desenvolvimento de novos antibióticos e modificações em classes existentes, como as carbapenêmicos, oferece esperanças. Desde 2010, mais de 29 novos antibióticos receberam aprovação, embora muitos sejam variações de classes já existentes, e a resistência cruzada permaneça uma ameaça constante. A busca por compostos com mecanismos de ação inéditos é urgente.
O papel da educação pública e da prevenção não pode ser subestimado. Programas que promovem o uso racional de antibióticos e que enfatizam a importância de práticas básicas de higiene, como a lavagem das mãos e a vacinação, podem prevenir a propagação de infecções e, consequentemente, reduzir a necessidade do uso de antibióticos. A OMS estima que a melhoria do acesso a água potável e saneamento adequado pode prevenir mais de 337 mil mortes anuais associadas a esse problema.
A falta de regulamentação adequada no uso de antibióticos em comunidades e hospitais, bem como a prática generalizada de prescrição sem receita médica em muitos países, continua sendo um grande obstáculo. Também deve ser ressaltado que todo hospital deve ter uma Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, ação regulamentada pela Anvisa, que estabelece normas para a prevenção e controle de infecções relacionadas à assistência à saúde.
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A resistência antimicrobiana representa um dos maiores desafios à saúde global e à sustentabilidade dos sistemas de saúde. A urgência em desenvolver novos tratamentos, implementar estratégias eficazes de prevenção e promover a conscientização pública sobre o uso racional de antibióticos é evidente. Sem uma ação coordenada e inovadora, enfrentaremos um futuro em que infecções tratáveis poderão novamente se tornar fatais.
Fonte:O Globo
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